O velho mundo em 7 dias e o mundo novo em 7 palavras:
Conforme determina a piedade cristã, a Sexta-feira Santa ficou marcada pelo encerramento da Vigília de Adoração ao Senhor Jesus. Na celebração da última Via Sacra, o silêncio inaugurou períodos de meditação entre os quais ouvia-se apenas os passos cautelosos da peregrinação e os pássaros anunciadores da alvorada.
Na Solene Ação Litúrgica, houve a veneração da cruz na qual Cristo se ofereceu como Sacrifício Perfeito para remir os pecados do mundo. Para além das possibilidades de expressão da linguagem, só o silêncio dos filhos do Senhor foi capaz de adorar verdadeiramente a prova de amor derramada na cruz em forma de corpo e em textura de sangue. Ao narrar o Evangelho da Paixão de Cristo, é preciso ter em mente que não se trata de um teatro que simplesmente representa o sofrimento de Jesus. Na verdade, a Paixão da Morte de Cruz transcende o sentimentalismo banal presente no convívio de tantos relacionamentos e grupos sociais. A Paixão aqui registrada diz respeito ao Ágape Divino, isto é, ao amor incondicional que sobrevive aos limites impostos entre a vida e a morte. Em um mundo cada vez mais propenso a tornar pessoas objetos descartáveis, apaixonar-se para Jesus é reconhecer-se no outro a ponto de doar sua própria existência como ato de misericórdia.
Ao propor essa reflexão com tamanha eloquência, Irmão Domingos enfatiza que somos responsáveis pela crucificação diária de Cristo em todas as vezes que negamos ao próximo o amor que levou Jesus a morrer por nós. Por assim dizer, o sacerdote comentou sobre as circunstâncias da vida de Jesus que cada cristão também vivencia sem a mesma postura de acolhida, sabedoria e humildade. As mulheres apedrejadas por meio de palavras ultrajantes, os enfermos abandonados no leito, as crianças esquecidas nas ruas e os idosos desprezados pela família: tantas cruzes depositadas no ombro dos que mais precisam de um colo. Todos eles muito mais identificados com Cristo do que qualquer frequentador assíduo da Igreja. No fundo, o cristão deve escolher entre personificar o exemplo de Jesus ou de seus algozes. Ao final, se a escolha for o caminho celeste, Nossa Senhora aguarda os bem-aventurados com seu colo e carinho maternal, assim como sustentou o corpo de Seu Filho castigado pelos cravos e pela coroa de espinhos.
Segundo as palavras incendiadas pelo fogo espiritual da voz de Irmão Domingos, “o letreiro da maledicência” assume a figura dos católicos e religiosos que tão somente velam à distância o corpo de Cristo e não incorporam as atitudes de Fé demonstradas pelo Cireneu e por José de Arimatéia. Em sentido metafórico, honrar o corpo de Jesus significa levantar do chão o irmão caído nas agruras da vida.
Após o sermão em memória e glorificação de Cristo Crucificado, o povo de Deus seguiu em cortejo de profundo silêncio pelas ruas da cidade. As orações proclamadas durante a procissão e a sinfonia melancólica perfeitamente orquestrada pela Banda Municipal Nossa Senhora de Nazareth ambientaram o clima de dor e esperança que marcou o percurso do Cordeiro Imolado até o sepulcro. Por fim, a noite declinou como se não fosse mais possível amanhecer. Mesmo assim, o coração contrito de cada filho de Deus voltou para casa na esperança da Ressurreição e batendo no ritmo das horas que anunciam o Tempo de Páscoa do Senhor.
Matéria- Guilherme Freitas
Fotos- Helder Ramos, Hugo Geovani, Luan Braz
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