É muito comum associar o dia de finados ao tema da morte. No entanto, a trajetória de Cristo constitui um exemplo de como a morte é uma passagem e atende, na verdade, a um projeto maior de revelação da verdadeira vida em plenitude e harmonia com o Senhor. Nesse sentido, morrer deixa de significar o fim de uma história para introduzir o ápice de uma experiência que consome o corpo para elevar a alma e o espírito aos céus. O cristão que adentra os portões da eternidade não pode ser tido como um finado, pois o fim da matéria não é capaz de esgotar a sua existência. Na verdade, seria mais apropriado concebê-lo como um iniciado no Reino de Justiça reservado por Deus a cada um de seus filhos.
Confiantes na alegria gloriosa do Cristo Ressuscitado, irmãos e irmãs revigoram sua força interior para dissipar as trevas do remorso e do inconformismo. Enquanto a vida pulsa no corpo, é importante que se esteja vivo o bastante para reconhecer a presença divina no ciclo da natureza (nascer, crescer, reproduzir, envelhecer e morrer) e também no espetáculo das coisas simples, como a folha deslocada pelo vento ou o sorriso da criança distraída. Preencher o cotidiano com sentimentos negativos equivale a substituir a esperança de salvação inaugurada por Jesus pelo desespero de conquistas ilusórias que não suportam o peso implacável do tempo.
No livro de intenções da Santa Missa, verificou-se em grande medida a valorização da ancestralidade, ou seja, muitos filhos de Nazareno tiveram a preocupação de orar pelas almas de seus antepassados. Isso remonta à tradição bíblica de reconhecer a grandeza daqueles que vieram antes de nós. Desde o patriarca Abraão, todos os descendentes e herdeiros da missão religiosa conviveram de perto com a perda de entes queridos, porém sua confiança no Alto rebaixava a dor, a tristeza e a saudade para então confirmar a certeza de uma vida liberta das amarras do pecado.
Na contramão do murmúrio de tantas filosofias ressentidas pelo Mistério da Fé, Pe. Rondineli propôs uma leitura da condição humana nos seguintes termos: "minha fé não se resume a ossos ressequidos, porque o Cordeiro triunfou sobre a morte absoluta. A Ressurreição expurgou o caráter de condenação da morte e apresentou os homens à sua face redentora".
Ao invés de cultivar a angústia do fim que se aproxima, os cristãos devem munir-se da Palavra para cruzar o limiar que devolve nosso coração a Deus.
Matéria-Guilherme Freitas
Fotos-João Carlos Castanheira, Cássia Pereira e Carmen Nogueira
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